segunda-feira, 1 de março de 2010
Desperdício milionário de remédios e insumos médicos.
Nova farmácia para fornecer remédios a doentes crônicos deveria ter sido inaugurada em agosto de 2009, mas a obra ainda não foi concluída | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
Autoridades deixaram R$ 15,6 milhões em produtos perderem o prazo de validade, entre julho e novembro do ano passado. Material ficou estocado em vez de ser distribuído a hospitais públicos ou a pacientes em tratamento
POR PÂMELA OLIVEIRA
Rio - Medicamentos, materiais médico-hospitalares e insumos como luvas e gazes, que deveriam ter sido usados em hospitais ou disponibilizados para a população, perderam o prazo de validade na Central Geral de Abastecimento do estado, em Niterói. De acordo com relatório preliminar do Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus), do Ministério da Saúde, a Secretaria Estadual de Saúde e Defesa Civil desperdiçou R$ 15,6 milhões com produtos que perderam o prazo, entre julho e novembro do ano passado.
Entre o material inutilizado estavam R$ 649,6 mil em medicamentos que fazem parte da grade de remédios excepcionais, que devem ser fornecidos a pacientes com doenças crônicas, como esclerose múltipla, Parkinson, hepatite B e C e outras de alto custo. O desperdício deixou indignados os doentes que dependem do fornecimento de medicamentos do estado, que é feito na Farmácia Estadual que funciona no prédio do Iaserj, no Centro.
Pacientes revoltados
“Tantas pessoas precisando de remédio e o estado deixa estragar. Eu fico triste não só por mim”, disse o aposentado Luis Favrat, 69 anos. Com parkinson, Luis precisa de dois remédios. Quarta-feira, ele saiu de casa em Olaria e não conseguiu um deles, o Prolopa, que custa R$ 45 a caixa. “Falaram para voltar segunda-feira”. Com os R$ 15,6 milhões jogados no lixo, o estado compraria 348 mil caixas do remédio que o aposentado precisa.
Portadores de esclerose múltipla também poderiam ser beneficiados com a verba desperdiçada. “Há mais de um mês, o estado não entrega o Interferon Beta 1A. Os pacientes estão desesperados porque sem a medicação aumenta o risco de crises que podem deixar graves sequelas”, diz Neusa Rocha, presidente da Associação Força e União dos Amigos e Portadores de Esclerose Múltipla.
Com os R$ 15 milhões perdidos, o estado poderia ter comprado pelo menos 1.744 caixas de Interferon Beta 1A, que tem preço máximo ao consumidor R$ 9 mil.
“É uma falta de respeito, de cuidado, de tudo.Por que o estado não usou os milhões para comprar o Interferon que está em falta e é vital para os doentes?”, disse Neusa.
A vistoria do Denasus foi feita a pedido do Ministério Público Federal, que assinou Termo de Ajustamento de Conduta com a Secretaria Estadual de Saúde, em 2007, renovado em 2008. Entre as determinações que deveriam ter sido cumpridas pelo estado está a construção de nova farmácia de dispensação, que deveria ter sido concluída em agosto de 2009.
Segundo o Denasus, em novembro apenas 40,4% da obra estava concluída. O relatório indica condições precárias na farmácia do estado, por enquanto no Iaserj, além da falta de 29 medicamentos.
Secretário denunciou gestão anterior
Não foi a primeira vez que medicamentos perdem a validade na Central Geral de Abastecimento. Em julho de 2007, o estado divulgou a descoberta de R$ 20,4 milhões de remédios e outros itens, como vacinas e sondas, vencidos entre 1999 e 2007.
“O que encontramos aqui é mais do que desorganização: é falta de cuidado com o dinheiro público e com a saúde da população, que não tinha acesso aos medicamentos que, estocados, perdiam a validade”, afirmou, em 20 de julho de 2007, o secretário de Saúde, Sérgio Côrtes, que na época referia-se aos produtos que perderam a validade na gestão anterior à sua.
Na época, Côrtes comunicou o fato ao Ministério Público e à polícia. “Temos um caso de improbidade administrativa e, ao que parece, criminal”, disse, em 2007.
Procurada para explicar o atual desperdício, apontado pelo Denasus no relatório feito em novembro do ano passado, no entanto, a Secretaria Estadual de Saúde e Defesa Civil argumentou que o relatório é preliminar. E negou que o valor do prejuízo seja de R$ 15,6 milhões. “O valor do descarte — que refere-se a toda perda registrada durante o ano de 2009 — foi de R$ 8,1 milhões”, disse em nota.
O órgão alegou que o valor representa 1,48% de suas compras e que o percentual “está dentro dos padrões internacionais”. Diz ainda que “vem trabalhando para reduzir cada vez mais as perdas por descartes de medicamentos, insumos e equipamentos.” O estado não explicou a razão de não ter inaugurado a nova farmácia em agosto e afirma que será aberta no primeiro semestre.
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